Um dos momentos mais emocionantes no Japão foi certamente o treino realizado no Ibaraki-shiju dojo, que a maioria de nós conhece apenas como o dojo “do inferno” ou “de Iwama” . Na verdade, a pequena cidade de Iwama não existe mais como município independente e agora é agregada à prefeitura de Ibaraki. O dojo, construído pelo O-sensei Morihei Ueshiba, está sob responsabilidade do sensei Isoyama e recebe pessoas de todo o mundo que vêm para ficar como alunos internos (uchi deshis) ou treinar como visitantes, que foi o meu caso.

DSC_0132-1A viagem para lá leva cerca de duas horas saindo da estação de Shinjuku do JR (Japan Rail). De lá é preciso ir até a estação Ueno (25 minutos pelo JR) e então pegar o trem que passa em Iwama. Há poucos horários, então é preciso se informar com antecedência. Para quem vem do aeroporto de Narita, é necessário pegar a Kesei line até a estação de Nippori e depois a Joban line para Iwama.

 

Placa na estação de Iwama.

Eu e meu grupo (11 pessoas) saímos bem cedo de Tokyo, onde estávamos treinando no Hombu dojo porque nosso treino seria bem no começo da tarde. Chegando na pequena estação que corta a "cidade" o funcionário que gentilmente nos atendeu, ouvindo as palavras "Aikido dojo", rapidamente nos deu um mapa improvisado indicando o caminho. Todo o percurso não leva mais de 10 minutos e passa por ruas bem estreitas e calmas. Talvez devido a hora ou mesmo a tranquilidade da vila não se ouvia nada nem ninguém.

 

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A estação de Iwama e o caminho até o dojo. Imagens: Rainer Gauger 

 

Seguindo as indicações, chegamos a um rua bem estreita de onde se avista primeiro o templo Aiki, que o fundador construiu em 1943. Do outro lado, um pequeno caminho de terra leva ao dojo (este construído em 1945). Um aluno do dojo estava terminando a limpeza do templo e nos recebeu dizendo que o sensei Isoyama logo estaria lá. Ele nos conduziu pela propriedade de onde, aos poucos, apareciam vários outros uchi deshis, todos já vestido com o dogi. Mais tarde, um deles me explicou que há sempre dois treinos por dia (um pela manhã e outro a noite) e que esse da tarde era especial e reservado aos dias em que o dojo recebe visitas. Isoyama sensei estava se recuperando de um cirurgia no joelho e era a primeira vez que ia ao dojo em muito tempo. Isso explicou em parte a alegria dos alunos internos em poder estar com ele e mostrou a importância desse dia. Aliás, foi interessante observar também a disciplina do alunos quando o sensei chegou: todos estavam enfileirados no caminho por onde ele passaria enquanto um aluno abria a porta do carro para ele e outro nos orientava a esperá-lo em seiza numa pequena ante-sala do dojo. Imediatamente depois das apresentações o sensei falou que iríamos ao templo Aiki e perguntou se estávamos prontos. Dito isso, saiu rapidamente conosco atrás nos esforçando para acompanhá-lo.

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O templo Aiki. Imagem: Rainer Gauger

Isoyama sensei nos explicou que, diferente da nossa cultura onde basicamente temos um só deus, aquele templo foi erguido para 43 divindades (ou kamis) e que isso é arraigado na cultura japonesa e do Ueshiba sensei. Ele então conduziu uma pequena cerimônia onde participamos nós e os alunos internos do dojo.

Estar naquele lugar construído pelo O-sensei e participar da pequena cerimônia que ele deve ter repetido inúmeras vezes ali foi realmente especial.  Iwama parece ser uma cidade tranquila e aquele local ainda mais. Durante a cerimônia, só se ouvia a voz do sensei e o vento passando pelas portas abertas do templo. Desde quando comecei a me preparar para ir ao Japão, um dos meus desejos sempre foi poder ir a Iwama mas não sabia se seria possível treinar lá. Entrar no templo Aiki foi muito mais do que desejei, então tudo o que pude fazer nessa hora foi agradecer por poder estar ali. Finalmente, o sensei pediu que voltássemos até o dojo e que os alunos fechassem as portas do templo. Meus colegas saíram rapidamente mas eu tive de perguntar se poderia ajudar os alunos. Parece bobo, mas imaginei quantas pessoas não-uchi deshis (e mesmo eles) já tiveram a oportunidade de fechar as portas daquele templo…

Voltamos ao dojo, o treino começou e pude continuar a entender os alunos: muitos dos mais novos nunca haviam treinado (ou treinado muito pouco) com o sensei e ele tem um carisma imenso. Nos contou algumas passagens de seu tempo com o fundador e fez um treino bem descontraído. O clima era de festa mesmo e dava para sentir o profundo respeito e admiração daquelas pessoas por ele. Éramos 21 pessoas, de várias partes do mundo, treinando auma arte que começou a se desenvolver justamente naquele lugar. Eu pessoalmente me senti dentro de um dos vários vídeos que assisti do O-sensei ali com seus alunos. O Isoyama sensei comentou que o espírito do fundador permanece ali com em nenhum lugar. Mágico mesmo…

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Isoyama sensei. Imagens: Rainer Gauger

Isoyama sensei fez questão de chamar todos os yudanshas presentes (que bom que fiz exame!) como ukes e é impressionante a força dele. Meus colegas estavam apreensivos porque seria meu primeiro treino desde que havia machucado as costas alguns dias antes mas não pude perder essa oportunidade. Quando o sensei me chamou, eu já nem sentia mais dor alguma…

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O dojo de Iwama. Imagens: Rainer Gauger e Luciana Fernandes

Depois do treino, fomos convidados a tomar chá na área externa da propriedade e foi um momento muito divertido e informal. O sensei nos fez diversas perguntas e brincou com todos nós a respeito do pequeno número de meninas presentes. Havia outros alunos estrangeiros lá e pudemos trocar informações a respeito da rotina deles no dojo, além de endereços e contatos. Quando o sensei precisou se retirar, a cena da fileira dos alunos se repetiu mas todos estavam sorrindo e pareciam bem felizes. Aí pudemos dobrar hakamas, nos trocar e tirar algumas fotos antes de iniciar a viagem de volta.

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A grupo, antes e depois do treino. Imagens: Ricardo (uchi deshi)

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Lado externo do dojo. Imagens: Rainer Gauger

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Aiki Shrine. Imagens: Rainer Gauger

NOTA 1: Eu levei duas câmeras fotográficas e não lembrei de fazer foto nenhuma. Obrigada aos colegas que me cederam as suas.

*Este é um texto que faz parte dos relatos da viagem ao Japão que fiz entre setembro e outubro de 2009.

Comments (2)

On 21 de janeiro de 2010 às 10:13 , Anônimo disse...

Olá.
Já estava com saudades.
Ainda bem que está de volta.
Um abraço.
Micaela

 
On 22 de janeiro de 2010 às 01:15 , Soraya Teixeira disse...

Oi, Micaela!
Que bom, também estava com saudades daqui.
Abraços!
Soraya